Indicada ao Grammy Latino e especialista em desenvolvimento de projetos culturais, a artista conversou com o Vou de Grade sobre as leis de incentivo à cultura
Quem é a artista?
Eu sou Adriana Sanchez, cantora, compositora, sanfoneira. Sou uma artista independente com mais de 25 anos de carreira e faço a gestão de toda minha carreira solo e da Barra da Saia, banda feminina que eu criei.
Sou a única brasileira patrocinada pela empresa alemã Hohner desde 2011, a empresa mais antiga de instrumentos do mundo, que patrocina Iron Maiden, Steven Tyler, Stevie Wonder, e estou desenvolvendo uma linha com meu nome com a Weltmeister, outra empresa alemã.
Minha área de atuação hoje se divide entre shows, projetos incentivados, infoprodutos, licenciamento, minha produtora de audiovisual e elaboração e captação de recursos através das leis de incentivo e editais.
Quais formas de financiamento ou incentivo à cultura você já utilizou em seus projetos e qual lei de incentivo à cultura você já utilizou? Por quê?
Em 2013, eu conheci o assunto e entrei no universo das leis de incentivo e editais de cultura e, desde então, fui me especializando. Hoje sou referência no assunto. Há 2 anos desenvolvi o curso Viva de Música 2.0, que capacita artistas independentes para serem autossuficientes nesse universo. Já utilizei e utilizo todas as leis tanto governamentais no âmbito federal, estadual, municipal, as leis emergenciais. Também participo dos editais privados e editais internacionais.
Eu tenho certeza de que esse é o melhor caminho para que o artista independente tenha liberdade artística e financeira para que possa produzir sua arte com autonomia. Quem trabalha com as leis de incentivo também aprende a fazer a gestão da carreira porque entende o processo de realização em todas as etapas. Diferente do que muitos pensam, é um ótimo caminho para artistas pequenos.
Quais foram as principais dificuldades que você enfrentou ao buscar financiamento ou incentivo para seus projetos culturais?
No início, minha maior dificuldade foi entender a burocracia. Nós, da música, não fomos feitos para burocracia, nosso foco é a arte, a música. Não temos treinamento e nem nos preocupamos em investir em conhecimento. Então, a gente faz do jeito errado e, consequentemente, se frustra com o resultado, criando desculpas para o nosso fracasso com frases como “é só para artista grande”, “só os mesmos conseguem”, “tem que conhecer alguém“…. Na verdade, a culpa é nossa mesma, que não queremos nos aprofundar em conhecimento por preguiça, comodismo ou medo.
Sem projeto, não tem patrocínio, e sem saber como apresentar o projeto ao patrocinador também não tem patrocínio. Outro erro também é que eu demorei para entender que o projeto para a aprovação é um e o projeto para o patrocinador é outro. Quando entendi isso, passei a obter patrocínios com frequência.
Você acha que essas leis são acessíveis a todos os artistas e produtores culturais?
Eu não acho, eu tenho certeza que está ao alcance de todos. Quem não consegue é porque fez da maneira errada, é porque não sabe elaborar o projeto com tudo que é necessário. Tenho alunos que nunca tinham escrito nada e, na primeira tentativa, com o passo a passo correto, com a clareza de como fazer, receberam 50 mil, 100 mil reais para seu projeto, algo que eles nunca sonharam.
Alunos que têm carreiras regionais e pequenas, sem nenhuma visibilidade e de cidades muito pequenas, um deles tem 3 seguidores no YouTube, o que mostra que o tamanho da carreira não tem nada a ver. Eles entenderam que o que aprova não é o tamanho da carreira, mas sim um projeto bem escrito com especificidade e clareza.
Como os sistemas de fomento e incentivo à cultura impactaram sua carreira ou de quem você trabalha?
Eu aumentei a oferta de produtos na minha esteira de negócios porque, além dos meus projetos onde realizo shows, gravações, conteúdos audiovisuais, entre muitas coisas que já fiz, passei a elaborar projetos para outras pessoas e a captar recursos e, consequentemente, aumentei meu faturamento e passei a gerar muito mais imposto e empregos na cadeia da economia criativa.
Nesse momento, eu acabei de receber 120 mil reais de um fomento municipal para produzir 6 faixas autorais. Estou recebendo para compor, terei tempo para gravar, para pagar todos com qualidade, terei verba de divulgação. Algo que para muitos artistas é impossível, para mim é algo corriqueiro porque eu nunca deixo de participar de nenhuma oportunidade.
Você acredita que esses incentivos são fundamentais para o desenvolvimento da cultura e das artes no país?
Os incentivos são fundamentais para democratizar a arte e a cultura, para oportunizar o aparecimento de novos talentos que dificilmente teriam condição de custear um projeto no início da carreira, para manter viva a identidade e a preservação da cultura brasileira, que é muito rica e diversificada, e são essenciais para o desenvolvimento socioeconômico do país.
Quando se fala de incentivo à cultura, falamos de exposições, teatro, dança, música, audiovisual, documentários, filmes, restauração de museus. Uma das funções das produções culturais é a democratização de acesso, que traduzindo é fazer a cultura chegar em lugares e pessoas que raramente têm acesso à cultura, como periferias, pessoas de baixa renda, com necessidades especiais. Já que democratizar o acesso é uma obrigação do projeto.
Além disso, algo que poucas pessoas sabem é que todo projeto cultural tem a obrigação de oferecer contrapartidas sociais, que podem ser oficinas, workshops, formação, entre outras ações que devem ser realizadas na comunidade onde o projeto acontece. Espetáculos que cobram ingresso disponibilizam uma porcentagem de graça para escolas públicas, ONGs e entidades sociais. Poucas pessoas sabem disso.
E falando de renda, um projeto realizado com apoio financeiro, seja por verba direta ou indireta, gera muitos empregos, além de movimentar a economia nos locais onde o projeto se realiza, contratando os serviços locais. Todos os pagamentos exigem uma formalidade, o que gera recolhimento de impostos. Dados oficiais da FGV levantaram o seguinte dado: a cada R$ 1,00 que é investido em um projeto cultural através da Lei Rouanet, o país recebe de volta R$ 1,59 em impostos gerados pelo próprio projeto. Ou seja, a Lei Rouanet traz um retorno 59% maior que o valor financiado.
Imagina isso em um projeto de 1 milhão? É algo muito rentável para a economia do Brasil. E falando de desenvolvimento do país, a economia criativa hoje representa 3,11% do PIB nacional. Isso não é pouco, para você ter ideia, o setor automotivo representa 3% e recebe muito mais incentivo e gera muito menos emprego.
Investimento em cultura é um grande negócio para o país, para o público, para o artista e para o governo.
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